segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Mostra "Arte e Cárcere"

Sempre achei que o poeta era um sofredor. As melhores poesias nascem da dor, de indignações, revoltas e sofrimentos. Provas vivas disso são meus poetas favoritos: Drummond e Ferreira Gullar. É lógico que há exceções (Vinícius de Moraes é uma), mas em geral as pessoas sensíveis, os poetas-natos, costumam viver num exercício de eterna empatia: se deparam com situações e tentam vivê-las na pele. Ou as vivem e as descrevem livremente através da poesia. Pois bem, os poemas que passarei a postar semanalmente comprovam com clareza o que relatei: os melhores poetas são os que sofrem.

Não acredito em coincidências, e cada vez mais a vida me mostra que o acaso não existe. Na última Sexta-feira, estive no CCJF para assistir ao Forum de Direito Constitucional da EMARF sobre "O papel do Poder Judiciário na Concretização do Direito à Saude". No local realizava-se uma Exposição de poesias da Mostra "Arte e Cárcere". Admirando toda a sensibilidade dos artistas, me deparei com uma belíssima poesia justamente sobre o tema sobre o qual tenho pesquisado: "A Inconstitucionalidade do Exame Criminológico". Quem ler a poesia de Wayne S. Santos (abaixo), feita em meio aquele ambiente opressor perceberá que nenhum criminólogo, jurista, antropólogo ou sociólogo JAMAIS seria capaz de descrever esta injustiça de forma tão verdadeira e sincera.

Apresentação da exposição, realizada pela Fundação Santa Cabrini: "Com todas as agruras e violações do cárcere, os artistas não se deixam derrotar. Eles escrevem, sonham com a liberdade, amam mais do que nunca. E as poesias retratam essas aspirações que versam das paixões às sátiras sociais, e confirmam que a mente humana será, eternamente, inaprisionável".

Psicologia
(Wayne S. Santos)

O seu castigo é este:
Falar comigo quando chegar,
Sentar na cadeira e me entrevistar,
Saber da minha vida e como será.
O seu castigo é este:
Me fazer perguntas e saber como estou,
Quais os meus problemas,
A dor, o dilema,
O que me apavorou.
O seu castigo é este:
Formar idéias, mas sempre com as suas,
Saber se eu minto,
Se a verdade é a sua.
E como será o meu amanhã.
O seu castigo é este:
Parar, pensar, dar o seu parecer,
O que será que pensou?
O que será que vai ser?
Será que o juiz pensará o mesmo?
Não tem sentido em nada isso tudo.
E tentar sobreviver sem matar.
Coisas que são anormais no mundo.
É onde se procura Deus,
E a melhor forma de amar.
E também nos mostra
Como é maravilhoso nosso Deus.
Pois antes aqui,
Do que morto.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Do título e a Inconstitucionalidade do Exame Criminológico

Tentarei ser breve nesse primeiro post. Falarei do título do Blog, "Idéias Perigosas". Oscar Wilde dizia que "Uma idéia que não é perigosa não merece ser chamada idéia". Não poderia concordar mais, especialmente nos últimos dias. Explico: cheguei à conclusão de que a covardia está, lentamente, se tornando um modo de vida. As pessoas não têm sequer coragem de expor suas idéias, ainda mais se elas contrariarem às da maioria, o senso comum. Buscando me distanciar dessa atitude, e não ceder ao impulso de limitar minhas idéias, crio este Blog. Não será um Blog apenas sobre Direito, mas sobre temas diversos. Obviamente será inevitável para uma jurista apaixonada pelo direito enquanto instrumento de transformação social escrever muito sobre Direito e Defensoria Pública, mas tratarei sobre temas interessantes: psicologia, vegetarianismo, filosofia, meditação, yoga, música, sustentabilidade, política, justiça social... Será um Blog, no mínimo, eclético.

Meu primeiro artigo será sobre a "Inconstitucionalidade do Exame Criminológico", tema pouco explorado na doutrina brasileira, embora defendido ferrenhamente por alguns Defensores Públicos. A idéia do artigo surgiu numa reunião do Forum permanente de Direitos humanos da EMERJ: "A Psicologia na Execução Penal: a serviço da repressão ou da garantia dos direitos?". Saí de lá comovida com a situação dos psicólogos que querem fazer um bom trabalho, zelar pela saúde dos encarcerados, mas são tristemente obrigados a limitar sua atuação a um exercício de futurologia: tornaram-se fazedores de Exames Criminológicos. Não têm tempo para mais nada, apenas para aliviar a consciência dos magistrados, atestando que "Fulano de Tal voltará (ou não) a delinquir". Se é revoltante prá mim, nem quero imaginar o que as psicólogas que conheci estão passando. Foram ameaçadas de prisão no caso de se negarem a realizá-lo, muito embora a realização do malfadado exame seja completamente contrária ao seu Estatuto de Ética e até mesmo à recente Resolução de nº 009 do CFP, abaixo transcrita:

Conforme indicado nos Art. 6º e 112º da Lei n° 10.792/2003 (que alterou a Lei n° 7.210/1984), é vedado ao psicólogo que atua nos estabelecimentos prisionais realizar exame criminológico e participar de ações e/ou decisões que envolvam práticas de caráter punitivo e disciplinar, bem como documento escrito oriundo da avaliação psicológica com fins de subsidiar decisão judicial durante a execução da pena do sentenciado.

A citada resolução, infelizmente, por motivos políticos resta ineficaz, provisoriamente. Assim, senti necessidade de escrever sobre o assunto, tão importante e ao mesmo tempo tão pouco explorado. Pelo que pude notar, tornou-se assunto de vida ou morte para os psicólogos que trabalham na Execução Penal. O Exame Criminológico é completamente inconstitucional. Não vou expor meus fundamentos prá não estragar a surpresa, mas fica aqui o convite à reflexão.